A leitora Magdala Domingues Costa resolveu desabafar
contra a “realidade desvirtuada” que a novela da Rede Globo, ‘Velho Chico’, faz
do povo nordestino. E ela não deixa de ter razão.
Confiram:
Senhor
Carlos Britto,
Sou
apenas uma cidadã indignada, apolítica, medianamente instruída e razoavelmente
inteligente, que se insurge com o desserviço que a Rede Globo presta ao país
retratando aspectos tão medíocres, falsos na novela “Velho Chico”.
Descobri
seu blog e venho trazer minha contribuição em nome das duas nordestinas que
trabalham comigo, que me pediram que reclamasse, neste português: “não somos
burras, nossa gente não é assim, suja, feia”.
O
que deveria ser uma ode ao grande rio genuinamente brasileiro, tornou-se uma
narrativa tão cretina que elas estão furiosas, ofendidas e já se recusaram a
acompanhar a novela…pasme!!
Pediram-me
que escrevesse para alguém, protestando, acredite, torno a lhe assegurar.
Tenho
77 anos e prescindo da assistência delas – uma analfabeta, mas de grande
sensibilidade – devido a limitações impostas pela minha saúde.
Afora
minha visão “elitista”, realmente, não dá para ficar indiferente.
Onde
o autor ou diretor de arte, sei lá que nome tenha, foi encontrar os tipos
retratados?
Suas
roupas maltrapilhas, sujas e suarentas, sugerem que os nordestinos daquelas
paragens sejam horrorosos e quase asquerosos. Em pleno século XXI usam telefone
celular, possuem uma “cooperativa” onde guardam arquivos e existem vários
computadores. Entretanto as empregadas domésticas da fazenda parecem escravas
alforriadas, à beira de fogões a lenha e coadores de café pré-históricos.
Como
há um viés político que não consegui ainda entender, imagino-me diante de um
quadro surrealista, sem a mínima lógica ou objetivo razoável.
Viajei
muito pelo mundo dito desenvolvido procurando aprimorar minha instrução,
aproveitando todas as oportunidades de enriquecer-me culturalmente. Nesse
aspecto sou uma privilegiada, muito agradeço a Deus e busco levar a meus irmãos
mais humildes um pouquinho de informação.
Na
Noruega conversei com um guia instruidíssimo interessado em saber detalhes da
história do Rio São Francisco, curioso sobre as nossas conhecidas carrancas às
quais atribuía semelhança com as proas dos navios vikings, etc. Tomou mil
anotações sobre o que expliquei como pude. Então o senhor pode imaginar como me
sinto com esse achincalhe, no meu ponto de vista. O “coroné” Saruê –
interpretado pelo Antonio Fagundes – de tão caricato parece um palhaço de circo
mambembe. O coitado do padre é tão sujo e com um chapéu encardido na carapinha
desalinhada que ofende a igreja católica mais “progressista”. E por aí vai.
Não
há “liberdade de expressão” que justifique tanta mediocridade, nem viés
político de esquerda que possa ser levado a sério. Seria interessante que uma
produção desse porte, envolvendo vultosos gastos, contribuísse, além de
focalizar os aspectos tristes que bem conhecemos e renegamos, como a jagunçada
e os problemas das terras, fossem apresentados o que já conquistamos, a produção
de frutas etc. Não sei de onde tiraram aquele “sotaque baiano”. Enfim…
A
mim ofende o desrespeito à minha brasilidade, mas me incomoda sobremaneira a
imagem deturpada que transmite sobre uma região tão bela, rica, de população
tão afável e hospitaleira, cujos milhares de representantes migrantes,
construíram, humildemente anônimos, as grandes metrópoles, como a que habito.
Sou apenas um sussurro, mas empresto essa voz impotente para solicitar a outros
mais jovens, como o senhor, que prezem nosso sentimento pátrio e valorizem
nossa cultura e tradições.
Cordialmente
Magdala Domingues Costa/Leitora
(foto/imagem reproduaçãoCarlos Britto